Grupo de Estudos Pensar - Prof. Manoel Thomaz Carneiro
Fundado em 1989, as aulas visam promover uma reflexão sobre os sentimentos,as sensações e as emoções de nosso cotidiano através das visões das ciências à experiência humana. São temas que tratam das questões da vida com objetivo de alargar o pensar de cada um.
quarta-feira, 3 de janeiro de 2024
Curso Leblon 2024
sexta-feira, 20 de janeiro de 2023
Como Somos?
sexta-feira, 6 de janeiro de 2023
Você se Parece Com o Que? Com o lugar externo? O que a define?
Adoro, para descansar a cabeça, folhear revistas e como um devaneio descompromissado me ponho a ler uma a uma. São pinçadas revistas de decoração, de psicologia orientada para o público feminino, bem como outras tantas.
No sábado estava com espírito buscador de ineditismos e lá fui com olhos aventureiros em busca de algo novo. Encontrei uma revista linda, folha e capa de primeira e com adrenalina comprei-a.
Preparei-me para fazer a descoberta e com a manta me aninhei.
Ao abri-la vi que se tratava de uma revista sobre festas cool e DJs. Que decepção a minha! Nada a ver comigo. Só tinha comprado esta.
Nada a fazer!
Comecei então a pensar nos questionamentos que havia colocado numa das aulas do segundo semestre de 2022 “– Qual a sua maior identificação atual?”
“– Você está parecido com o que?
– Você está parecida com quem?”
A minha revista estava destituída de qualquer elemento identificatório comigo. Era um significado que não se tornou significante. Eu, portanto não tinha identificação alguma com ela.
Pensei nas identificações que temos na vida.
Você pode se identificar com mar ou piscina, cidade ou floresta, com cão ou com gato, com filme francês ou americano, com cabala ou com o budismo. Cada coisa irá definir a sua pessoa, o seu estilo e o seu perfil.
Mas além dessas existem também as identificações com as circunstâncias, com os sentimentos, com as realidades e com os acontecimentos positivos ou negativos.
Você já se fez esta pergunta? Já se indagou o por que você carrega um sentimento há tanto tempo?
Você está parecido com o que? Com o abandono que alguém trouxe a você e passou a viver como pessoa abandonada?
Você está parecida com o vazio de uma ausência e se tornou o vazio?
Está sem perceber fixada nas situações que criam apenas os sentimentos ruins?
Deixou de se identificar com as coisas que estão corretas e boas e está projetada nas identificações negativas?
Se sim, está então na leitura da revista errada que não trará nada de construtivo para você.
Identifica-se apenas com os vazios, as doenças, os remorsos e as faltas? Tem dúvida que o seu rosto será o reflexo do que você se identifica?
Como Freud afirma, é através das nossas identificações que estruturamos nossa realidade psíquica e através dela é que vamos sentir a vida.
Tornamo-nos coerentes com aquilo que nos fixamos, identificamos e introjetamos.
Se você só se alimenta das coisas que faltam ou que estão com defeito de modo algum poderá sentir satisfação em si mesmo, em relação à vida ou em relação a alguém.
Somos modelados através daquilo que mais olhamos.
Toda vez que alguém descobre no curso que sou filho da Virgínia, aquela que realizava palestras sobre testemunhos de vida em vários locais, ouço: “Você se parece com ela.”
É fato! No modo de ser por me identificar com muitos aspectos dela e também de meu pai, assimilei e tudo passou a fazer parte da minha psicológica corrente sanguínea.
Já percebeu se você está reproduzindo algum padrão de comportamento da sua avó melancólica?
Você está parecido com o seu tio amargo?
Você está parecida com a sua mãe ressentida?
Você se torna a imagem e semelhança de suas identificações conscientes ou inconscientes.
Encontrei por acaso um conhecido que há muito não o via e que me contou que teve um problema no ligamento do tornozelo esquerdo. Contou-me que ficou um mês sem poder colocar o pé no chão. De muleta depois de uns dias se tornou impossível andar, pois machucava a palma das mãos. Disse-me que se pôs a encontrar uma solução. Como atendia em casa para trabalhar era mais fácil, mas para realizar a rotina diária tudo estava complicado. Parou, pensou com identificação em encontrar uma solução e a mente então trabalhou sob este comando e criou uma alternativa para ele: Imaginou uma mochila nas costas para carregar o que precisava de um lado para outro e para ficar livre da muleta passou a engatinhar… Ao se dar esta solução encontrou um modo de se perspectivar. Impediu-se de se identificar com a limitação e buscou uma identificação operacional, produtiva e positiva.
Mudou o seu foco. Olhou e elegeu para se identificar com a perspectiva de uma solução.
Mudança de foco é um ato de amor, de amizade a si, de generosidade e gratidão com o tempo que a vida nos oferece para viver.
Quando desejamos um “Feliz Ano Novo”, queremos que o ano seja diferente mas, na verdade será uma sequência de 24 horas… O que é pode ser potencialmente novo? Nosso modo de atravessamos as horas… O que pode ser “Novo” é atravessarmos o habitual em nós, o engessado…
Novo é agregar em nosso Eu peles novas…
Renovação do Eu é nascimento… E tudo que nasce traz entusiasmo e portanto felicidade interior.
Ganhei na última aula de uma aluna um livro intitulado “Poesia Completa de Manoel de Barros” da editora Leya, que achei a minha “cara”! Ao abrir me deparei com um trecho que transcrevo:
“Ando muito completo de vazios.
Meu órgão morrer me predomina.
Estou sem eternidades…
Enfiei o que pude dentro de um grilo.
Essas coisas me mudam para cisco…
Estou deitado em compostura de águas.
Na posição de múmias me acomodo.”
Assim se fez este interlocutor… Enfiou a vida em algo mínimo, que o fez cisco, e se posicionou como múmia a espera de outra vida para viver… Se tornou isso pois assim elegeu esta forma de ser para se identificar. Se fez pequeno, se fez cisco e se tornou múmia. Engessou-se para as perspectivas e se tornou petrificado.
Você sabe se dizer?
Vai se colocar deitado como múmia a espera de outra encarnação para ser o que pode ser agora?
Comece engatinhando… Com o tempo você irá se equilibrar nas boas identificações. Naquelas que trazem a melhor versão de você mesmo.
Eu, como se diz, não morri na praia.
Fui à banca, expliquei-me e troquei por outra revista.
Remova as identificações que mumificam e engessam as linhas negativas de ser.
Escolha bons momentos para se identificar, boas pessoas para se modelar e se perspective através das identificações positivas.
Saiba Ser.
Você se parece com o que?
Pode ter certeza: com aquilo que você escolhe para se identificar.
Portanto: seja plástico, mais do que plástica, renove a face do seu Eu…
O que acontece?
Se você assim fizer, verá…
A felicidade do entusiasmo de apesar dos tropeços, colocar na mochila psíquica um ser renovado…
Felicidade… A idade nova interna Feliz.
Entusiasmada.
Pense nisto!
Manoel Thomaz Carneiro
Psicanalista/Psicofísico
Crédito da Imagem: Patricia Secco (@patriciaseccoarte)
domingo, 1 de janeiro de 2023
Nosso Tempo Em Nós
Manoel Thomaz Carneiro
Psicanalista / Psicofísico
Créditos das Imagens: Sandra Ling
sexta-feira, 23 de dezembro de 2022
sexta-feira, 16 de dezembro de 2022
Seja Continuidade - Como?
sexta-feira, 9 de dezembro de 2022
Vidas: Temperadas ou Insossas
Gosto muito de entrar em livrarias para olhar guias e livros de fotografias de lugares. Outro dia, folheando um sobre restaurantes, me lembrei de uma mulher que vou chamá-la de Carmita, a qual fui apresentado há muito tempo. Na tentativa de encontrar um tema comum a todos para estabelecer uma afinidade, comecei a dizer naquele encontro, que uma das minhas ilhas de prazer na vida era viajar e sobretudo para novos lugares. Destinações desconhecidas me fazem mergulhar na perda das referências que me traz uma agradável sensação de desbravamento das culturas e dos paladares.
Enquanto falava, Carmita me olhou e com um pedido de licença em seu olhar, disse: “Detesto viajar... Olho as fotos dos lugares e me dou por satisfeita”. Eu a interpelei um pouco surpreso: “Nem para Tiradentes?” Ela, sem o menor tom de agressividade, mas com uma franqueza respeitável, de uma vez que aquela afirmativa iria restringi-la, me respondeu – “Não gosto de viajar, não gosto de jantar fora... Não faço questão de sair do meu mundinho”.
Lembro-me bem que a partir do que ela me disse, comecei a divagar silenciosamente em minhas considerações.
Pensei “Carmita da Caverna”. Pensei esta mulher como sendo uma pessoa que ao invés de conhecer um quadro diante dos olhos, acharia uma foto da tela suficiente, como se bastasse olhar o cardápio de um restaurante sem nada pedir...
Perguntei-me: A sua alma se alimenta de que?
Já pensou o mundo sem a curiosidade para além dos limites visíveis? O que seria de nós?
Estaríamos morrendo das mesmas doenças da idade média e até mesmo as de épocas anteriores. Mesmo a fotografia que a saciava foi inventada por uma alma instigadora.
O mundo evolui devido a emancipação do conhecimento. O nosso mundo interno também.
O crescimento nada mais é do que se aventurar ao novo estágio: o movimento de renúncia de uma condição para ingressar em outra.
Li uma matéria no jornal O Globo, sobre um elefante na Coreia do Sul do Zôo Everland, que consegue expressar cinco palavras em coreano: olá, sente-se, não, deite-se e bom.
Como declara a repórter, é obvio que o elefante não tem noção do que diz, mas o contato intenso com os humanos expandiu sua possibilidade.
O elefante não tem o aparelho fonador. Ele consegue dizer as palavras ao criar um meio para superar esta limitação. Colocou a tromba em sua garganta para que no sopro pudesse recriar o som das palavras...
Se um elefante que rompe seu nicho para se defender da solidão, pois não tinha nenhum companheiro de sua espécie durante anos, estabelece um contato além do que seria o natural e consegue assimilar aspectos que não pertencem a sua natureza, imagina uma pessoa o quanto pode acrescentar em si mesma, ao estabelecer linhas de comunicação e conhecimento com outros mundos.
Atualmente a Organização Mundial da Saúde afirma que nos centros desenvolvidos, uma pessoa de 72 anos tem a mesma perspectiva de saúde que uma de 20.
Nossa longevidade é fato certo no mundo atual. No entanto, viver mais deve ser aliado a viver emocionalmente bem.
De que adianta conquistar uma vida longa sem uma cognição bem desenvolvida?
De que adianta uma pessoa ultrapassar as barreiras cronológicas dos ancestrais e ter uma precária vida mental e emocional?
Hoje se sabe que alguém que assimila mundos novos e que se mantém inserido no contexto evoluído das ideias, desenvolve mais recursos no cérebro, estimula as sinapses e potencializa a sua resiliência, ou seja, fortalece a resistência em muitos espectros.
Portanto, meu susto em relação a Carmita passava longe de um preconceito pelo modo de vida, mas em saber que a permanência num mundo menor é fazer com que o cérebro deixe de encontrar desafios. Deixa com isso de evoluir. É se abrir ao mau porvir, pois o futuro virá, mas a qualidade em vivê-lo depende de cada um.
Outro dia estava perto da minha casa em Copacabana, e uma mulher de uns 25 anos me parou para perguntar: O Senhor poderia me dizer onde fica a Av. Atlântica?" - Confesso que fiquei meio impressionado dela não saber e respondi: Você está a uma quadra da praia. É só descer aquela rua."
Ela visivelmente emocionada me disse “Vim conhecer o mar.”
Sabe que a praia é tão parte da minha vida que nunca imaginei que encontraria uma pessoa adulta com a alegria de ver a orla que me é tão habitual…
Ao contrário de Carmita esta amplia os próprios horizontes e, com certeza, amplia vários sem depender de ninguém…
O psiquismo tem uma tendência natural a inércia, ele é estimulado no encontro com o novo e depois desacelera.
O novo é que estimulou o cérebro do elefante e é evidente que qualquer elemento novo tem o poder de estimular o meu, o seu e o de todos que se aventuram ao descobrimento.
Soube, tempos depois, que aconteceu com Carmita o que temi quando ouvi o modo excludente com o qual se conduzia. Começou a desenvolver uma senilidade, a partir de uma depressão. Não soube temperar… Vida insossa… Alguns diriam de modo leigo: “Ah… Problema inevitável da idade”. Grande erro.
O que faz com que uma pessoa seja considerada velha? A que ficou parada no tempo. Aquela que se exclui gradualmente do mundo. A que não acompanha o fluxo dos acontecimentos.
Aquela que perde a menina ou o menino curioso deixa de ser aventureiro de si mesmo.
Sabe aquele jogo de dados? Que você tira um número e conforme o lado você anda um determinado número de casinhas? Pois é… tem pessoas que andam para trás. Lançam sua sorte ao contrário do que seria favorável a si mesma.
Como disse Freud o importante é criar um mundo sobre o qual você possa e goste de viver. Toda pessoa que se fecha em si mesma, vai se “ensimesmando” e perdendo a habilidade de lidar com a vida e perde a conexão com ela mesmo que esteja em contato.
Se em conexão com um novo mundo até um elefante aprende a falar… Imagine o que você pode aprender em contato com um mundo além da sua realidade…
Enquanto “Carmitas” escolhem viver entrincheiradas nos mundinhos, há os “Máximos” da existência, que atravessam os limites e constroem a vida dos sabores.
Pena… que alguns com o tempo se tornam “Carmitas Ninguém” ao invés de se tornarem os “Máximos”.
A vida que vale a pena ser vivida?
Aquela que pode ser aprendida.
Aquela que é expandida…
Aquela que a faz crescida…
Para você extasiada com sua altura subjetiva poder dizer:
" Ah… Como é belo o mundo visto do alto."
Pense nisto.
Manoel Thomaz Carneiro
Psicanalista/Psicofísico
Créditos das Imagens: Patricia Secco (@patriciaseccoarte)
sexta-feira, 2 de dezembro de 2022
Abastecer e Florescer a Si - Para Um Ano Sem Anorexia Psíquica
Outro dia li uma entrevista com o economista grego, Loukas Tsoukalis, especialista e professor de integração europeia na qual falou sobre a crise nos países da comunidade do euro, onde sinalizou sua ideia sobre a falta de um estadista no mundo, de um líder político consistente e carismático para gerar uma unidade de sensação de segurança.
É fato que o ser humano sempre precisou de um farol que sinalizasse caminhos… Tivemos grandes faróis filosóficos, psicanalíticos, poetas e entre outros e hoje ficamos meio perdidos no que nos norteia de modo a se ter balizas consistentes para ponderarmos.
Ao ler esta declaração sobre a falta de um líder, pensei a respeito da mente que necessita de uma linha de raciocínio para refletir e fazer que possamos ter uma ideia consistente que nos oriente e responda as nossas questões.
Aprendemos uma série de coisas, colecionamos em nós, nomes, filmes, livros, situações, mas será que alguém sabe responder o que de fato é necessário encontrar para se suprir no campo psicológico?
Vejo no Hortifruti, que adoro ir, mulheres, homens com listas ou com apenas os olhos e os carrinhos abertos ao que as mãos seguram das prateleiras. Com certeza sabem sobre vitaminas, clorofilas, sobre o excesso e a falta do açúcar, enfim sabem tantas coisas sobre como misturar um queijo brie com a geleia de damasco, mas será que as pessoas sabem responder sobre o que pegar nas prateleiras do “supermercado mundo” para se abastecer?
Nosso inconsciente é plural e necessita, como o corpo, de elementos diversificados.
Precisamos de dose de mãe, de pai, de irmão, de irmã, de amigos, de criação, de erotismo, de sexualidade, de marido, de mulher, de filhos, de avó, de avô, de casa, de viagem... Precisamos encontrar tantas coisas para abastecer o carrinho existencial...
A felicidade é um presente de gratidão de nosso "Inconsciente Plural" pelo correto abastecimento interior. Por isto que tantos são abastecidos com roupas, viagens, casas, joias, carros e outros adornos e ainda assim sentem uma fraqueza melancólica no viço da alma.
Será que a lista de prioridades está clara na sua consciência?
Sendo o inconsciente plural, a dose de um único item irá satisfazê-lo?
Ter só a maçã para se suprir por completo?
Será também que está cercada de vários itens, mas se sente distante da felicidade? Será neste caso que a dose vivenciada de cada elemento de sua vida está sendo vivida na boa medida?
Ingestão contínua de ginástica e mais nada, ingestão de casamento em bulímicas doses...
A tristeza é a linguagem de nosso inconsciente plural que nos fala de sua anemia.
A tristeza nos deixa fraco porque nosso interior está desabastecido de bons alimentos ou de alimentos em doses erradas.
Se somos constituídos dessa pluralidade, a diversidade em medidas lúcidas e sábias nos fortalece.
A Biodiversidade Existencial é um ato de um bom sabedor dos nutrientes psíquicos necessários.
Como uma excelente receita de Dorival Caymmi: um cadinho de ioô, um cadinho de iaá...
Bota castanha de caju, um bocadinho mais;
Pimenta malagueta, um bocadinho mais…
O economista falou que falta um líder para organizar a crise…
Quem sabe a crise do continente você, esteja presente porque falta ser liderado por uma boa noção de economia psíquica? Oferta, demanda, valor agregado, produção e produtividade. Diante das prateleiras do mundo, saiba abastecer seu carrinho existencial… Olhe os prazos de validade vencidos, olhe os que são desnecessários e os fundamentais.
Um pouco de uma coisa, de outra, depois outra, uma mistura no sábado de tudo e na segunda-feira o que faltou no domingo e assim… Dia a dia com a nova nutrição mais balanceada a crise passa.
A saúde de seu inconsciente plural será a felicidade. E felicidade está naquele instante que você quer que nunca acabe…
Se você parar para pensar…
Descobrirá tantas e outras que poderá construir para si mesma…
Caminhar como nesta foto da Patrícia Secco no Vietnan…
Floresce internamente com consistência que você caminha na primavera do psiquismo… Ah que grande e monumental estação…
Manoel Thomaz Carneiro
Psicanalista/Psicofísico
Créditos das Imagens: Patricia Secco (@patriciaseccoarte)
domingo, 6 de novembro de 2022
O Direito de Existir
O Direito de Existir
Quando eu era pequeno havia uma novela que se chamava “O Direito de Nascer” e este nome me veio quando soube outro dia de um caso sobre um homem de quarenta e dois anos que impossibilitado por si mesmo e por medo do preconceito feroz de assumir o seu desejo, sua verdade afetiva e sexual de modo aberto e profundo, mergulhou gradativamente num processo de autodestruição através do álcool que está minando todos os setores da vida dele. Ele aboliu o direito de nascer para a vida que nasceu, lógico tendo como componente a cultura por vezes opressora.
Lamentei muito esta história e fiquei a pensar sobre a dificuldade humana em impor limites, em assumir condições, em dizer não aos excessos de solicitações, do “envergonhamento” para expressar opiniões, e sobretudo, na culpa de arrancar determinadas máscaras.
De fato, desde que nascemos precisamos que nos desejem para que sejamos bem recebidos na vida. Esta condição de dependência do outro nos coloca de imediato na posição de submissão, de sedução, de busca de aprovação e de contínuas provas de acolhimento.
É fundamental que você e todas as pessoas saibam que as experiências de sermos respeitados nas diferenças e nas opiniões trazem para nós o progressivo registro em nossa estrutura, que podemos de certa forma contrariar ou mesmo podemos deixar emergir determinadas singularidades em nossas vidas cotidianas. Como se o mundo nos dissesse através do respeito nos nossos primeiros tempos de existência, que somos amados como sujeitos, singulares.
Essa vivência liberta a pessoa para o direito de uma série de expressões, que vai desde o de escolher um sabor de sorvete até definir uma profissão ou estilo de vida e até o modo de viver afetos.
A experiência do olhar respeitoso às singularidades suscita a liberdade para se expressar e conviver sem constrangimentos.
Somos semelhantes e isto envolve as diferenças, pois se não fosse assim a afirmativa seria : somos perfeitamente iguais.
Uma pessoa que foi isenta dessa individualidade, que foi anulada em determinados direitos, até por uma cultura e moral retrógrada, cresce envergonhada até mesmo por ocupar um espaço no elevador. Convive com uma secreta sensação de inferioridade que pode passar pelos complexos. Constrói-se espelho do mundo que a cerca.
Às vezes a falta de um pai amoroso, ou mesmo a presença excessivamente autoritária e retrógrada esmaga a sensação de direitos e faz expandir apenas a noção de deveres. Torna-se uma pessoa colonizada, que pode responder a esta pressão com uma saída negativa, se tornando procrastinador e encolhido no mundo pessoal.
Há também uma resposta a estes quadros através de uma dependência e submissão como o caso de uma mulher que devido à dificuldade de dizer não, se deixava ser devorada e na impossibilidade de se colocar numa equidistância acabava por minar a convivência com as pessoas que se aproximavam dela.
Muitas pessoas destroem o que desejam por não saberem conviver através da noção dos espaços que cada um deve ter. Já que não sabem expressar o que as incomoda, rompem e se distanciam carregando permanentes dificuldades.
Sabe-se hoje, que algumas pessoas nascem com predisposição à chamada “Preocupação empática excessiva”, onde os valores dos outros ou necessidades são sempre vistas como próprias, como se houvesse um espelho cujo reflexo do outro se confunde com a própria imagem.
Outro dia num encontro casual, quando ia caminhar, a filha de uma conhecida me contou que o namorado não ligava para a aparência e, portanto, nunca se vestia de forma apropriada. Já tinha ido até de sandália a casamento. Não adiantava falar, pois odiava ser criticado.
O que parece isso?
Uma evidente forma de oposição a alguma autoridade extrema vivenciada em sua criação. Pulou da opressão para a liberdade através da rebeldia agressiva. Tornou-se igualmente autoritário. Continua preso, pois quem busca sempre fugir é porque ainda está acorrentado.
Como é importante se compreender e tomar consciência há que está ainda aprisionado através de uma culpa ou constrangimento em ser.
Saiba que para existir e buscar se afirmar, se faz desnecessário abolir todas as regras, códigos ou pedidos.
Incorporamos padrões nos nossos modos de ser. A modificação de hábitos, até os mais arraigados, pode ser realizada, afinal somos neuro plásticos.
O hábito ou o traço de uma personalidade é um comportamento adquirido por alguma razão. No entanto, pode-se tomar consciência do que de negativo se está fazendo consigo mesmo.
Entenda o que se passa na sua cabeça e modifique o que destrói o seu prazer cotidiano que a torna uma pessoa constrangida em ser a própria pele, a própria essência.
Muitas pessoas criam seus filhos como projetos pré determinados do que devem ser quando crescerem…E se não correspondem, uma batalha narcisista é travada…A batalha de transformar o outro numa projeção de si…Isto é amor? Ou poderíamos dizer um amor envenenado pelo obtuso desejo de ser através do outro…
Quantos se submetem a solicitações perversas e a total falta de respeito.
Nietzsche tem uma indagação que sempre recorro ao avaliar algum aspecto da minha vida ou opções: “Você vive hoje uma vida em que gostaria de viver por toda a eternidade?” e complementa em outro texto: “Nossa dor vem da distância entre aquilo que somos e o que idealizamos
Tudo na vida é de fato uma questão de postura diante de si mesmo."
Quando eu tinha treze anos seguia um curso de inglês no Oxford. Uma vez foi passado como exercício a construção de um texto. Escrevi um diálogo comigo mesmo em inglês. Decidi por essa forma por achar que se eu já pensava em outro idioma era porque dominava os vocabulários e os verbos que deveriam ser aprendidos.
Depois da leitura na sala, a professora me deu zero. Eu tive um choque, pois não havia erro gramatical algum. Perguntei o porquê e ela simplesmente me respondeu que ninguém conversava consigo mesmo. Ela abusou da autoridade.
Abuso, sobretudo ignorante, pois estava ali para corrigir a matéria e não tinha o direito de podar a criatividade.
Ao invés de me sentir condenado, falei com os meus pais e pedi para sair. Lógico que tive o total apoio.
Saí daquele curso na hora... Disse não àquela autoridade neurótica.
Penso que a criatividade daquela professora estava destruída e que ela estava impedida de encontrar a si mesma.
Sem direito a pensar, sem direito a existir.
Quantos podam a existência através das inibições, dos complexos e das submissões inseguras.
Aprender a dizer não é uma questão de respeito à vida e ao Direito de Nascer e Renascer.
Converse consigo mesmo em inglês, francês português, só não converse diante daquela minha professora!
Quando pensamos através dos bons discernimentos passamos a abrir grandes possibilidades para existirmos bem.
Grande ironia do destino quando penso na professora e na pessoa que me tornei... Sou um contínuo pensante.
Esta é a minha ideia, nesta semana, para se reinventar a vida.
Ao invés de se destruir pelos medos, deve-se construir sempre a ideia de que temos o “Direito de Nascer”, para que se possa responder a grande questão "Nietzschiana" desta forma:
A vida que estou construindo eu posso vivê-la em toda a eternidade?
Manoel Thomaz Carneiro
Psicanalista/Psicofísico
Créditos das Imagens: Patricia Secco (@patriciaseccoarte) & GettyImages