Como professor dos cursos que ministro no Leblon, ouço uma série de indagações em busca de compreensão sobre os sentimentos e as atitudes saudáveis para a perspectiva de uma vida equilibrada.
Um dos aspectos mais questionados é o que seria importante inserir e cultivar na vida.
Sábado retornei após alguns anos a Teresópolis, pois tinha um almoço na casa de uma amiga escritora com vários sucessos editoriais, cuja família se entrelaça em convívio há tempos com a minha.
Ao longo da tarde uma sensação de aconchego e serenidade se instalou em mim, que me trouxe um delicioso sossego na alma.
Éramos cinco a falar sobre tantas coisas e quanto mais o tempo passava, mais sentia surgir um elo de calor como se estivesse reforçando laços... Em um determinado momento, discorríamos sobre reencontros com pessoas que há muito não se veem, mas que quando ocorre, salta da alma a sensação de cumplicidade, como se o afastamento não tivesse apagado o alinhavo de amizade construído na trama da convivência.
Nesse momento divagador sobre distâncias e aproximações, a psicanalista que estava presente nos disse: “Quando a cumplicidade não se perde é sinal que os vínculos que ligam são fortes.”.
Pensei nesses vínculos que nos unem, que ligam uns aos outros e que são fundamentais em nossas vidas.
A certeza de termos estabelecido fortes alinhavos de amor com as pessoas significantes nos fortalece em nossa existência.
Quantas e quantas vezes o frio da incerteza pode ser abandonado devido a uma presença sincera, devido a uma tarde que nos envolve como redes de segurança.
A falta dessa liga afetiva pode potencializar angústias e pela sensação real do desamparo que surge, cria a ruptura da estrutura psíquica. A falta de unidade da mente causa sérias consequências psicológicas negativas.
A escultora Camille Claudel, apaixonada por Rodin em determinado momento da vida, foi abandonada por ele, pelo irmão, pela mãe e pelo pai, e internada num sanatório sem qualquer presença próxima e afetiva. Viveu a partir de então solta nos tormentos e isenta do amparo profundo, mergulhou numa gradual clivagem psíquica que a fez uma mulher absolutamente encerrada em si.
Muitas vezes as mãos espalmadas do outro em nossos corações massageiam nossas forças e estimulam a motivação para viver.
Essas mãos faltaram para Camille Claudel. A sensibilidade e a libido sublimada em arte expressas nas obras criadas por ela, muitas vezes mais expressivas e intensas que as de Rodin, se perderam. Transbordaram em falta de propósito e se transformaram em sideração e inabilidade para viver.
"Valsa" de Camille Claudel
A vida sem laços nos faz siderados. Faz a pessoa orbitar sem capacidade de aterrissagem no plano do real.
Os elos afetivos saudáveis contribuem para a percepção de que a vida é praticável e pode ser prazerosa.
"A Catedral" de Auguste Rodin - foto de Vitoria Liberal Lins
Como afirma o conceito psicanalítico: o Outro é concebido como um espaço aberto de significantes que a pessoa encontra desde o ingresso no mundo.
Diante dos grandes sofrimentos, esse grande outro caloroso, pode ser simbolizado como um fiador, que assegura valores para que a vida possa ser resgatada sempre para a boa continuidade...
Como afirmou Lacan: “Na neurose há a ruptura da fala plena entre o Sujeito e o Outro”.
O “Outro” completa simbolicamente nossas falhas e supre o nosso interior das lacunas do amor pleno.
O “Outro” nos abranda.
Respondo, portanto que se há algum aspecto a ser olhado como primordial é a consciência do papel do “Bom Outro” em nossas vidas.
A minha tarde de sábado foi um belo laço as boas razões de enfrentar, trabalhar e se cuidar. Assim através da tríade positiva de enfrentamentos, trabalhos e cuidados me fiz inteiro para aproveitar a presença de quatro grandes vínculos naquela tarde de sábado que abrandaram deliciosamente a minha existência...
O que considerar prioritário?
Caminhe contra a corrente atual da superficialidade dos laços e cultive elos de amizade e amor.
Freud afirmou que se Cura por Amor. Quando encontramos uma fonte para amar encontramos uma direção para caminhar.
Ao criarmos laços com o “Outro”, criamos pontes pelas quais poderão passar as energias de apoio e estímulo à continuidade.
Os bons vínculos nos vinculam à vida.
Imagens: Google e GettyImages
Que bom mantemos esse laco, lendo suas mensagens.
ResponderExcluirBjs
Lylian Fraga Braganca
Amei, amei, amei, como sempre, meu querido professor.
ResponderExcluirUma crônica TÃO RELEVANTE nesses tempos de superficialidade, onde tudo está virando descartável e substituível....
Mais um presentão!
ResponderExcluirQue enorme prazer poder ler semanalmente, aqui em Lisboa, as suas crónicas e interiorizar os seus ensinamentos e tentar aplica-los para " Pensar bem"
Abrç
Isabel
ResponderExcluirAdorei a crônica, Manoel!!! Beijo, Eleonora